quarta-feira, 2 de novembro de 2011

Memória

Eu permaneci na tentativa de decorar.
Eu permaneci na tentativa de decorar.
Estou decorando. De cor. De coração. Decoração.

A casa está indo embora junto com quem foi. Eu permaneci tentando buscar e tentando registrar a posição de tudo, o cheiro, o tempo que fazia naquela última tarde. A posição, os quadros.Eu carreguei um quadro. Eu lembrei que antes, ainda quando menina eu gostava de entrar pelo portão lateral: havia uma chave escondida, que todos sabiam que havia, ao alcance das mãos. Meu crescimento foi medido, para mim, à medida que eu conseguia ou não alcançar a chave escondida do portão que dava no corredor. Ontem na memória vi que em seguida do corredor ficava um cercado do antigo cão, foi desfeito, mas eu tinha medo e desejo de passar por ali. Seguiam as plantas e esse corredor parecia maior quando eu seguia na barra da saia da preta que cuidava da casa, todas as manhãs, na lavagem da ardósia. Dentro de casa eu lembrei da minha mania de achar que me perdia por tantas portas e corredores que se encontravam em voltas e voltas, eu gostava de dar voltas. Tinha o canto da máquina de costura, onde eu sempre ficava nos pés da Nina, minha avó, catando pedaço de linha e qualquer coisa que caísse e ia servir pra montar meu mundo. Depois vinha a sala de dentro e a sala de fora. As janelas. Eu, morando em apartamento, achava uma coisa linda ficar em uma janela de casa mesmo, que dava pra rua, pra ver gente, janela de madeira, que abre e fecha em folhas e tem vidros em quadrados.
Hoje a casa ficou pequena, eu fiquei grande, alcanço a luz da sala de estar e dou muita conta de pegar a chave escondida do portãozinho de fora do corredor. Mas não há mais chave, nem vó, nem vô, nem porquê. Só há a minha tentativa em memorizar tudo e deixar aqui escrito, contando com a compreensão do leitor.Porque isso é só um registro pra que eu não perca o que eu vi por todos esses anos.

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