domingo, 22 de abril de 2012

Sobre endurecer

Eu seria capaz de afirmar que a paz vem dos domingos em Barra Mansa. Mais precisamente naqueles em que a segunda-feira é feriado. Eu poderia afirmar que a paz é o banho quente que tomo no banheiro todo branco. A água muito quente que me cai nas costas, as minhas mãos vermelhas que estendo e colo no azulejo branco. Vermelhas do quente que ferve. A porta que fecho para que a fumaça ali permaneça. No cubículo branco, a conta de um vaso-pia-chuveiro. A fumaça que me entontece. Essa tontura que não passa e a pouca noção de realidade que se tem em um banho. O corpo banhado por água fervente, uma fumaça inebriante e a última coisa que se lembra é a atual fase da Nova Ordem Mundial. Surge então o novo fenômeno que me vem ocorrendo e pertubando os dias fora dos banhos em Barra Mansa. Tenho tomado uma noção horrível de lugar no mundo. Tenho sentido que meu corpo tem tomado carne. É a sensação que se tem de um cimento fresco endurecendo até se tornar chão, parede. Sinto todos os dias o meu leve espírito, o jovem, o novo, o sonho endurecendo-se, tomando-se por carne, encarnando. É o endurecimento recorrente na maioria dos seres humanos. Todos. Quase todos endurecem. Eu endureço, eu estou endurecendo dia após dia, e sentir a própria carne, ou melhor, o próprio espírito endurecer é de uma dor descomunal. É como, no meio de toda a leveza, ser aprisionado em uma caixa rígida. É desconfortante. Ter seus ossos e mente paralizados, e o processo dessa paralização dói. Há quem não sinta, há quem nasça duro, há quem nunca endureça. Eu endureço e tenho doído incessantemente por todos esses dias que seguem. Viver dói. Mas a paz dos banhos em Barra Mansa ainda me sustenta em fingir não escutar a mulher que grita, o telefone que toca e a vida que segue lá fora.

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