domingo, 31 de janeiro de 2010

Sem

Hoje eu não quero discutir política,
não pretendo saber sobre as desigualdades sociais,
nem se quero ter alguma atividade missionária de preservação das aldeias do Xingu nos próximos 5 anos.
Hoje não tô no clima de tentar entender Foucault,
e só por hoje não me importo se os responsáveis pelo vazamento de óleo na Baía de Guanabara não foram punidos. Hoje eu nem sei mais se crime ambiental prescreve ou não.
Acordei sem vontade de me culpar por não ter posição política definida
e evito saber tanto da grande enchente de Barra Mansa ou dos desastres no Haiti.
Hoje não vou chamar a humanidade toda de hipócrita e não vou condenar o cinismo.
Não vou procurar saber se o Joel Santana vai dar conta do Botafogo, mesmo com o time tão ruim.
Não tô com saco pra ser politicamente correta e talvez eu até jogue lixo no chão.
Não quero nem saber se o aquecimento global existe ou é uma teoria da conspiração e se o homem pisou na lua.
Não vou crucificar a Jovem Guarda nem nenhuma outra música da década de 60 e 70 que não tenha conteúdo político.

Hoje vou sentar aqui, tomar uma cerveja e ouvir um samba, ou até mesmo ouvir o Roberto.Porque hoje, nem odiar o Roberto eu vou.

sábado, 30 de janeiro de 2010

O pedido.

Adoro quando ela chega assim de manhã.
Uma morenice lavada de cara e de corpo. Um cheiro de banho, os cabelos molhados de uma água fria.
Adoro quando ela chega assim, com roupa de casa, ainda de chinelas. O cabelo meio sem jeito, a cara meio de sono.
Chega, aperta os olhos, às vezes torce a boca como que fazendo movimentos pra lembrar o pedido que me faz todos os dias igual:

-três pães, por favor.

sexta-feira, 29 de janeiro de 2010

Eu estou mesmo mobilizada por uma tristeza única, de música suave.

Escrevo agora pela angústia que me toma o peito.
Ainda me preocupo muito com o envelhecimento dos meus óvulos enquanto o mundo gira.
Uma mulher que sonha ser mãe e sonha mais.Sonha um mundo.
Enquanto eu fico sonhando, espero a hora de partir. Enquanto eu fico fantasiando coisas que só existem para mim, o mundo continua existindo e eu não me dou conta.
Vivo encenando uma vida só minha, sem público, sem platéia. É triste. Choro. Escrevo para me desafogar. Não sei quem lê. Só sei dessa minha angústia em querer assistir o mundo de fora.Só sei desse meu medo de viver e, ao mesmo tempo, essa vontade louca de tê-lo todo sobre meu domínio.Desvendar cada canto dele,só,sozinha, e acompanhada.Não sei bem do que falo e, nesse momento, as coisas se confundem. Os papéis, os idiomas, as cenas. Acho que hoje não é um dia bom para mim. É dia de fazer o carro morrer.Não são os hormônios.
Eu estou mesmo mobilizada por uma tristeza única, de música suave.
Ouço uma menina chorando de soluçar dentro de mim e não a consigo encontrar.O choro me persegue e eu preciso achar esse fio de choro pra entrar nesse ritmo e me desafogar, junto com a menininha.

Vim parar no mundo sendo menina com um olhar triste.
Desde menina, um olhar triste.
Com o tempo fui aprendendo. Aprendi a me fantasiar.
Então foi assim. Aprendi a acordar e vestir a fantasia como fosse mesmo um personagem.Assim, dia por dia, vestindo uma fantasia pra viver cada vida.
O colorido e as flores vem como uma forma de desviar a atenção de quem vê aqueles olhos que são tristes. Aí vem o cabelo comprido que enlaça, embaraça pra distrair e dar a intenção de leveza. Tudo calculado para parecer e disfarçar os olhos.
Os olhos. O olhar triste.
...Mas há dias em que a fantasia não cabe.

segunda-feira, 25 de janeiro de 2010

Amarelo

Como quem bebe um aguado suco de caju precisa lembrar que a água suja que bebe é caju, eu precisava sorver aquele dia, imaginando que era um dia bom.
Fingindo.
Mas eu tô cansada demais de colocar a jarra de suco de caju desbotado em uma parede branca para ver que ele é amarelo,que é de caju, e não é uma água suja apenas.
Beber pensando que bebe caju. Cansada.
Eu quero o amarelo manga, mesmo odiando manga.Porque se,ao menos, o suco fosse de manga, ele seria algo no meu mundo. Ele seria algo para eu odiar. Se aquele dia não fosse tão desbotado, e fosse manga, eu seria capaz de sentir algo por ele.
Mesmo que fosse o ódio que sinto pelo gosto da manga, mas não por seu amarelo.

sexta-feira, 22 de janeiro de 2010


No meu dicionário, a fotografia é o método de eternizar sorrisos.

quinta-feira, 21 de janeiro de 2010

le petit prince




-Por favor...cativa-me! disse ela.
-Bem quisera, disse o principezinho, mas eu não tenho muito tempo.Tenho amigos a descobrir e muitas coisas a conhecer.
-A gente só conhece bem as coisas que cativou,disse a raposa(...)
-Que é preciso fazer?perguntou o principezinho.
-É preciso ser paciente, respondeu a raposa.Tu te sentarás primeiro um pouco longe de mim,na relva.Eu te olharei com o canto do olho e tu não dirás nada.A linguagem é a fonte de mal-entendidos.Mas, cada dia,te sentarás mais perto...

No dia seguinte o principezinho voltou.
-Teria sido melhor voltares à mesma hora,disse a raposa.Se tu vens,por exemplo,às quatro da tarde, desde as três eu começarei a ser feliz(...)

domingo, 17 de janeiro de 2010

Ressaca.

Por que você teima em ser assim, garota?Por que você é teimosa em se evitar?Você, que parece viver em uma redoma como a Rosa de Bela.Nascida incompleta parece viver e tendendo a nunca se completar.Uma incompletude completa para sempre será?Menina bonita que se evita, por que chora?Você não tem o direito de chorar, porque não se dá o direito de sofrer por amor.Se esquiva, arisca.Foge, some,escorrega.Vai viver triste. Teimosa teima em traçar destino futuro criança cachorro sotaque.Uma coisa que acontece na cabeça e desce pro peito,pressionando o coração que não sente, em sua função única de pulsar o sangue.Uma angústia que mata o peito da menina que sofre por não conseguir sofrer de amor.Que será feito dela então?Singularmente uma fria carinhosa que passa pela vida e não a entende. Quer um par e não consegue se entregar. O que a trava? O que a faz chorar tanto sem saber, coberta de uma tristeza bonita de músicas de lamentos de peitos de frases...Por que ela teima em procurar pra não achar?Por que ela não sente, mas procura tanto a solidão? Que medo há?Que arte há nisso? Tão calma cansada de calma.Ela se acha atriz, uma estrangeira fazendo seu papel na própria vida.
O filme é triste.

terça-feira, 12 de janeiro de 2010

Tempo de Alice.

Alice aos três já mostra espírito aventureiro quando
solta da minha mão para descer as escadas
sozinha
Alice tem o cabelo amarelo e os olhos pretos de cílios
gigantes parecendo um bicho
mas em Alice fica lindo.
Alice fala paia, porque não fala r ainda,
mas fala em alemão quando nervosa.
Ela tem um peixe laranja e escolheu dar de presente ao padrinho
um carro ou um interruptor.
Quando apertada, faz xixi de cadeirinha no meio da rua
e depois me pergunta por que é que o menino que dorme na rua está sem chinelos.
Eu e Alice sentadas tomamos picolé no sol.
Alice disse:
-É tão bom que até dá vontade de sorrir, né tia Isabela?

domingo, 10 de janeiro de 2010

Recado

Ela lhe deixou um recado pregado pelo canto na ponta do papel na cortiça.
Eu li e senti. Assim dizia:

"Saudade enorme de conversar com você.Conversa do tipo
fiada, afiada ou sem fio.
Às vezes parece que a linguagem do mundo tá escrita em Mandarim ou
sou ruim de ler."

Ele disse..."poética", sem nem pedir licença.

terça-feira, 5 de janeiro de 2010

Patuá

Eu que não creio em astrologia,
combinação de estrela
e acho que planeta não tem casa.
Eu que não acredito em horóscopo,
bruxaria, magia, psicologia, homeopatia,
subversão.
Eu que não faço pedido a santo, não faço promessa,
não deixo trabalho em encruzilhada, não peço,
não rogo, não ajoelho, não faço mandinga.
Eu que não faço figa, não uso patuá, não entendo mapa astral, não vejo aura.
Eu que acho que energia, só elétrica.
Eu que não pulo sete ondinhas,passo debaixo de escada, tenho em casa gato preto
e saio pra dançar em sexta-feira 13.
Eu que tudo isso que sou,
de repente, fiz pedido à estrela que me desse você,
e pulei onda, e rezei bem forte, e coloquei flor pra Iemanjá, e comprei pimenta,e pedi 7 vezes:
você você você você você você você.

segunda-feira, 4 de janeiro de 2010

Uma ponta de nó de céu


Do Drummond pra Fabi, da Fabi para mim, de mim para você, com beijos:

"ponha a saia mais leve, aquela de chita e passeie de mãos dadas com o ar. Enfeite-se com
margaridas e ternuras e escove a alma com leves fricções de esperança. De alma escovada e coração estouvado,
saia do quintal de si mesmo e descubra o próprio jardim. Acorde com gosto de caqui e sorria lírios para quem
passe debaixo de sua janela.
Ponha intenções de quermesse em seus olhos e beba licor de contos de fada. Ande como se o chão estivesse
repleto de sons de flauta e do céu descesse uma névoa de borboletas, cada qual trazendo uma pérola falante a
dizer frases sutis e palavras de galantearia."

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